sábado, 4 de setembro de 2010

Queimada


De repente, uma folhigem leve e queimada é selecionada pelos longos braços do vento que a arremessa pelo céu já não mais azul. O pequeno resíduo voa involuntariamente como se estivesse finalmente livre do inferno que o aprisionara, o assustara e o transformara em meio as chamas amarguradas de um canavial.
Lembra-se de quando, ainda preso ao chão, adimirava os destemidos gaviões, os estranhos urubus e as tagarelas maritacas que, conforme suas características, planavam sobre os relevos irregulares das matas e dos solos. Acompanhou o crescimento dos longelíneos pés de cana-de-açúcar. Viu todos se agruparem enquanto se constituiam prontos como uma comunidade unificada. Ineficientes contra o fogo.
As chamas devoravam insandecidamente tudo que estava ao seu alcance, num ato de extremo egoísmo e gula.
Aquilo que antes pareceia um belo refúgio, em ardentes instantes, se transformou num labirinto de sofrimento e mortal.
De repente uma folhigem leve e queimada atravessa a fresta de minha janela e aterriza sobre minha mesa. Agora apenas uma poeira, sujeira, um borrão. Antes, talvez, um tamanduá, uma capivara, uma onça ou até mesmo um pé-de-canã.

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